Militância em movimento! O diálogo entre poder público e militância nunca é fácil, muito pelo poder de cooptação que o primeiro pode exercer sobre o segundo e também pelo quesito independência que militantes mais sérios tentam fazer prevalecer no embate. Neste momento, tanto na esfera estadual de São Paulo, comandada pelo PSDB, como na municipal, liderada pelo PT, existem pressões que mostram como esta relação é tensa, independente da coloração ideológica, porque, trata-se. no fundo, da relação de poder.
Entidades importantes ligadas aos movimentos gay e dos direitos humanos pedem a permanência da Heloísa Alves na coordenação estadual LGBT. O Blogay conversou com estes grupos que nos enviaram o seguinte documento:
“Ilustre Senhor Doutor Secretário de Justiça e da Defesa da Cidadania,
Vimos, por meio deste, cumprimenta-lo pela posse no cargo de Secretário de importante pasta de nosso estado. Temos certeza que Vossa Excelência conduzirá os rumos das políticas públicas voltadas para os cidadãos paulistas, norteadas com justiça, cidadania e igualdade.
Temos acompanhado o comprometimento da pasta no que se refere às questões voltadas à diversidade sexual por meio da Coordenação de Políticas Públicas para a Diversidade Sexual, e somos testemunhas de que os avanços foram muitos.
A criação do Comitê Intersecretarial de Defesa da Diversidade Sexual, composto pelas 11 Secretarias de Estado que tiveram demandas advindas da 2ª Conferência Estadual de Políticas Públicas e Direitos Humanos de LGBT de São Paulo, Gestão Pública, Esporte, Desenvolvimento Social, Turismo, Adm. Penitenciária, Cultura, Saúde, Educação, Segurança Pública, Emprego e Trabalho e Justiça, coordenado pela Coordenadoria citada, acenou para um novo caminho de perspectivas e de respeito a uma população tão discriminada em nosso país.
Outra importante articulação das Comissões da Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo, juntamente com a Defensoria Pública, Conselho Estadual LGBT e a Coordenação Estadual de vossa pasta, junto ao Conselho Estadual da Educação, culminou na inclusão de nome social nos registros escolares das instituições públicas e privadas no Sistema de Ensino do Estado -– Deliberação CEE 125, avançando no respeito e à dignidade de travestis e transexuais junto à educação de nosso Estado.
Atuação relevante foi a assinatura do Termo de Convênio firmado entre a Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania e a Ordem dos Advogados do Brasil, seção São Paulo, com a realização de oficinas de capacitação de advogados nas subseções no sentido de que as Casas dos Advogados recebessem denúncias amparadas nos termos da Lei 10.948/01, que pune práticas discriminatórias em face da homotransobia.
Nesse sentido, Senhor Secretário, queremos desejar uma gestão profícua à Vossa Excelência, e ao mesmo tempo manifestar nosso apoio à manutenção da Dra. Heloisa Cidrin Gama Alves à frente da Coordenação de Políticas Públicas da Diversidade Sexual, reafirmando nosso desejo que essa parceria se mantenha e se consolide ainda mais nos próximos anos, pois que o combate ao preconceito e a discriminação com a população LGBT de nosso Estado é nosso primeiro compromisso, juntamente com a garantia de maior orçamento e pessoal à Coordenação e à Comissão Processante Especial que julga os processos da Lei Estadual 10.948/01, para fins de melhor garantia dos princípios constitucionais da eficiência e da razoável duração do processo (administrativo). Nesse sentido, sugerimos que as multas aplicadas em razão de processos da referida lei sejam direcionadas ao orçamento colocado à disposição da Coordenação de Políticas para a Diversidade Sexual.
Ass: Comissão de Diversidade Sexual e Combate à Homofobia da OAB-SP, Mães pela Igualdade do Estado de São Paulo, Pedra no Sapato, Comissão Nacional de Direito Homoafetivo do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM),Comissão Estadual de Direito Homoafetivo do IBDFAM/SP , PV Diversidade, Dynamite , ONG ABCDs, Família Strongers, Comissões de Diversidade Sexual das OABs de Bauru, Santos, Peruíbe, Arujá, Campinas e Jabaquar, Comissão de Diversidade Sexual e Direito Homoafetivo da OAB Nacional.”
No município, o Blogay acompanhou o imbróglio, no final do ano passado, sobre as eleições do Conselho Municipal e, mesmo o coordenador de Políticas LGBT municipal Alessandro Melchior tendo afirmado que nada mudou, não é bem assim que os integrantes do Conselho enxergam a situação. As eleições ainda não aconteceram, foi através de pressões que a coordenadoria afirmou que ocorreria em fevereiro. Uma carta com diversas críticas à política LGBT da cidade de São Paulo foi divulgada no Facebook:
“CARTA ABERTA DA SOCIEDADE CIVIL DO CONSELHO MUNICIPAL DE ATENÇÃO À DIVERSIDADE SEXUAL SOBRE O RETROCESSO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS LGBT NA CIDADE DE SÃO PAULO EM 2014
Prezado Prefeito Fernando Haddad
Prezado Secretário de Direitos Humanos e Cidadania Eduardo Suplicy
Prezado Secretário Adjunto Rogério Sotili
Nós, representantes da sociedade civil do Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual, queremos através desta carta aberta encaminhar este relatório. Infelizmente informamos aos senhores que o ano de 2014 pode ser sem dúvida considerado o que mais retrocesso apresentou em termos de políticas públicas para a diversidade sexual na cidade de São Paulo, depois de anos se expandindo.
2014 foi o ano em que a sociedade civil do Conselho Municipal travou embates mensais nas reuniões ordinárias com a Coordenadoria de Políticas LGBT (CPLGBT), com Alessandro Melchior à frente. Inúmeros problemas como o atraso de vários meses das bolsas do POT (Programa Operação Trabalho) para travestis e transexuais, o fechamento e a não reabertura do Autorama (espaço de sociabilização LGBT no Parque do Ibirapuera), apesar de todo o esforço do Conselho na elaboração do Programa Autorama Legal, frustraram a sociedade civil. Houve também um grave problema com a Associação da Parada do Orgulho LGBT, informando que pela primeira vez, em 18 anos, foi prejudicada e preterida na organização das atividades do 18º Mês do Orgulho LGBT de São Paulo pela CPLGBT.
Tudo que foi comprometido para 2014, e tinha orçamento previsto, ficou para 2015: a mudança do CCH (Centro de Combate a Homofobia) para o Largo do Arouche, a unidade móvel, o projeto Transcidadania, a política de saúde integral LGBT, o CCH na zona leste. A execução das metas ficou bem abaixo do estimado ou esperado. Em carta enviada em 19 de janeiro pela presidente do conselho, Janaina Lima, praticamente todos os assuntos dos quais foram solicitadas devolutiva pela CPLGBT, encontravam-se em atraso sob alegações de ser algo ‘inerente ao poder público’.
Porém, a cisão ocorreu quando a Coordenadoria impôs uma alteração de forma unilateral no decreto do Conselho, aprovada por uma comissão minoritária e nunca deliberada pelo próprio conselho com a alegação de ‘falta de quórum’. O decreto acaba com o que de mais importante existia no Conselho paulistano: a divisão equânime por segmentos e independência de entidades. O novo decreto reduz de 15 para 7 vagas os segmentos, priorizando 8 vagas para ONGS, conselhos de classe e coletivos. Isso faz com o que o conselho perca independência que vem empreendendo durante toda sua existência. A farsa foi amplificada em audiências públicas e consulta online, já que foram rechaçadas praticamente todas as propostas, mantendo intacta a fórmula imposta, mais conveniente ao governo.
Nesse tema, cabe destacar que o coordenador da CPLGBT, Alessandro Melchior, realizou um verdadeiro golpe contra a sociedade civil no Conselho Municipal LGBT ao invocar a necessidade de um suposto ‘quorum’ que nunca existiu na história do Conselho, claramente para conseguir impor a posição do Poder Público. Para que o quorum não fosse atingido, o poder público deixou de enviar seus representantes a reuniões do conselho. O jurista Paulo Iotti destacou que pela Constituição Federal ninguém é obrigado a fazer nada senão em virtude de lei ou, no caso, pelo menos de decreto, regimento ou norma infralegal que o imponha, mas o coordenador não aceitou dialogar, inclusive invocando o subterfúgio de que Vossa Excelência, o Prefeito, é quem tomaria a decisão definitiva. Como aliás sempre foi a regra, já que nas eleições anteriores, o prefeito simplesmente adotou a fórmula aprovada pelo conselho. Desta vez, a diferença é que a mudança imposta pela CPLGBT, não foi aprovada pelo Conselho.
Para piorar, o mandato do atual conselho expirou, sem que um novo conselho fosse empossado ou mesmo eleito (o decreto sequer foi assinado pelo prefeito). Pela primeira vez desde sua implementação, São Paulo ficou sem reuniões do conselho, mesmo com uma demanda forte da necessidade de participação. Foi nos dito que aquela seria a última reunião, pois a seguinte já reuniria a comissão eleitoral, o que não ocorreu. Sob muita pressão, a CPLGBT aceitou realizar uma reunião em janeiro. A sociedade civil lotou o auditório do CRD (Centro de Referência da Diversidade) e ficou combinado que o conselho se manterá ativo até a posse do futuro conselho. O novo conselho terá em suas mãos a organização da 3ª Conferência Municipal LGBT, apesar de todos sabermos da falta de implementação das propostas das anteriores (em 2008 e 2011).
Temos, porém, que fazer referência positiva à criação de vagas para a população LGBT no Centro de Acolhida Zaki Narchi na zona norte de São Paulo e de algumas ações culturais na região central (principalmente no Largo do Arouche), embora consideremos insuficientes ante as necessidades da nossa população.
A sociedade civil do conselho conclama que o prefeito Fernando Haddad, somente assine o decreto de conselho municipal LGBT, se este tiver de volta a fórmula original de equidade entre os segmentos (LGBTTT), sem a inclusão de ONGS, conselhos de classe e coletivos.
A sociedade civil do conselho conclama que o novo Secretário de Direitos Humanos e Cidadania Eduardo Suplicy, ao qual a CPLGBT é vinculada, promova reais mudanças na Coordenadoria LGBT, tornando-a mais efetiva e aberta ao diálogo franco com a sociedade civil.
Janaina Lima – Presidente do Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual de São Paulo”.