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Stonewall, 45 anos, e os homossexuais no jogo do Brasil X Chile

Por Vitor Angelo

Exatamente há 45 anos, os direitos LGBT eclodiam com a chamada rebelião de Stonewall, um bar gay, em Nova York, que os policiais constantemente faziam batidas, extorquiam dinheiro dos frequentadores, prendiam e humilhavam os homossexuais. Capitaneado pelas travestis, no dia 28 de junho de 1969, seus frequentadores resolveram dar um basta durante mais uma blitz policial e as ruas do Village tiveram seus dias e noites de guerrilha, provando que, sim, podemos ser delicados (ou não), femininos (ou não), mas também somos combativos e guerreiros, diferente do discurso que tentam nos imprimir. Para comemorar a data, não poderia assistir o jogo entre Brasil e Chile, nas oitavas de final da Copa do Mundo, em outro lugar que não em um bar gay, aliás, em vários da região da Frei Caneca, uma das áreas LGBT de São Paulo mais famosa. Cada tempo em um, foram cinco, contando com os pênaltis, e o que eu vi foi que podemos, sim, ser despachados (ou não), iconoclastas (ou não), mas também entendemos do jogo e torcemos muito, muito diferente do discurso que quer separar homossexuais e futebol como se fossem coisas opostas.

Durante as horas que passei pelos bares, escutei reclamação do meio de campo, da atuação de Daniel Alves, Fred, William e Jô. Pedidos para Felipão mexer no time foram inúmeros. E quando Hulk fez o gol, depois anulado pelo juiz, a discussão que se sucedeu foi digna de comentaristas esportivos.

Gays se reúnem na região da Frei Caneca, em São Paulo, para torcer pela seleção brasileira (Vitor Angelo)
Gays se reúnem na região da Frei Caneca, em São Paulo, para torcer pela seleção brasileira (Vitor Angelo)

Apesar disto, e ainda mais legal e divertido, é que o humor gay esteve muito presente, o que impediu deste blogueiro não enfartar neste jogo que foi um super drama queen. Hulk, que é disparado o preferido dos gays, quando marcou o gol anulado, ao invés, do tradicional grito, uma turma fervida comemorou em coro: “Gostoso”. E quando o juiz anulou o tento, uma trans, ao meu lado, disse furiosa: “Vou unhar a cara dessa juíza”.

Os xingamentos típicos de quem assiste as partidas estavam todos lá presentes. A cada passe errado, chute para o gol chileno que não entrava, ouvia-se: um “fdp”, um “porra”, um “cara***”. Entretanto, o humor continuava presente, quando um marmanjo barbudo soltou um “porra”, uma bee musculosa respondeu alto, limpando a boca: “Onde? Achei que tinha limpado”.

Humor e conhecimento de futebol por boa parte dos torcedores (Vitor Angelo)
Humor e conhecimento de futebol por boa parte dos torcedores (Vitor Angelo)

“Vai, Neymara” já é um grito clássico dos frequentadores dos bares da região. Mas na hora mais dramática, os pênaltis, foi o humor que fez ninguém ficar com a pressão de 22 por 16 . “Afeminada, afeminada” gritou um grupo na hora que Neymar foi cobrar seu pênalti. “Neymaravilhosa” comemorou uma lésbica quando o craque marcou. “Neca odara” (pênis grande na gíria gay) foi o grito para Marcelo que também fez gol. Hulk ganhou o coro de “bundão”, ao que alguns protestaram pois achavam que bundão ia parecer covarde. E o gol não rolou. Mas, mesmo assim, fomos campeões. E a alegria, um estigma muito ligado os LGB T e que acho positivo, mesmo que redutor, pletorou todos os bares e cantos da Frei Caneca.

Muitos acreditam (e eu não discordo) que com o casamento gay, o pink money, os gays estão sendo adestrados para uma certa normatividade, sua rebeldia e liberdade sexual estão sendo amainadas, diferente do que propunha os primeiros anos pós-Stonewall. Porém, acredito que a subversão continua presente, de uma outra forma, mesmo que nas pequenas coisas e atos como esta de torcer com conhecimento e humor pela seleção e por um esporte com um histórico de homofobia tão entranhado que muitos tentam sempre nos dar cartão vermelho. Entretanto, espero que como fizemos em Stonewall, vamos cada vez mais ser escalados para titulares.

"Vai, Neymara!" É do Brasil (Vitor Angelo)
“Vai, Neymara!” É do Brasil (Vitor Angelo)

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