Blogay

A contribuição dos gays, lésbicas e travestis para o mundo

 -

Blogay é editado pelo jornalista e roteirista Vitor Angelo

Perfil completo

Publicidade

A tal questão de gosto dos homossexuais

Por Vitor Angelo

Recentemente, um texto de Marcio Caparica no site Lado Bi sobre a busca da masculinidade total que muitos gays se impõem e exigem dos seus parceiros e amigos gerou certa polêmica entre os homossexuais masculinos.

De forma breve explico, o texto coloca uma questão importante já discutida pelo colunista americano Dan Savage: que os homens heterossexuais vivem em eterno estado de vigilância por todos (seus amigos, as mulheres, os outros héteros, os LGBTs). Qualquer deslize dentro de uma conduta dita adequada para “machos”, podem acabar fazendo com que sejam apontados como homossexuais ou não tão “homens” (como se gays não fossem homens…) suficientes.

Ao fazermos tal policiamento de forma ostensiva ou mesmo de modo leviano e bem humorado, enfim, de todas as elas, contribuímos para a manutenção de certos padrões machistas e homofóbicos.  Afinal, por que nos interessa tanto a sexualidade do outro (desculpando-se apenas se for para fins sexuais)? E o mais estarrecedor é que fazemos esta vigilância com a maior naturalidade. Todos!

Levantado este ponto, vem o próximo que diz sobre  a exigência de muitos gays de se mostrarem machões. O texto diz: “Amarrar-se a uma masculinidade completa é a verdadeira demonstração de uma visão limitada do que é ser gay. O homem que se coloca nessa jaula se priva de samplear a enorme gama da sexualidade humana, e se engana quando se sente privilegiado ao se limitar à caixinha de uma identidade que sabe não ser a sua. Não adotar alguns (ou muitos) comportamentos pintosos porque não se identifica com eles é normal e razoável. Quando um homossexual repudia absolutamente tudo do “mundo gay”, no entanto? Isso é sintoma de um medo de rebaixar-se ao se afastar do olimpo tão cobiçado da heteronormatividade. E pior, ceder a esse medo não traz vantagem nenhuma. Ninguém além do próprio vai considerá-lo um gay melhor por isso – nem os héteros, muito menos os ‘outros’ gays. Melhor é escapar dessa tocaia e se permitir experimentar outras atitudes. A vida vai ser mais relaxada – e quem sabe até mais feliz”.

Pronto, bastou isto para muitos homossexuais nos comentários do post se revoltarem contra o autor. A desculpa: a questão do gosto. “Mas eu gosto de ser masculino”, ou “Eu prefiro sair com homens discretos”. Antes de mais nada, gosto se discute sim, porque ele não é só uma conquista individual, ele carrega muito da cultura, muito mais do que pensamos, por isto ele se modifica, se aprimora, se cultiva. Se fosse estático como algo individual que trazemos do nossa nascimento, ele não se transformaria.

Posto isto, é muito estranho em diversos aplicativos gays, chats de encontro entre pessoas do mesmo sexo nunca aparecer: “só curto efeminados”, “dispenso discretos”. Se é uma questão de gosto, porque não existe este gosto por efeminados, mesmo que em pequena escala. Se a nossa sexualidade é tão diversa porque estas categorias nunca aparecem como algo desejável. Há alguns anos, era muito frequente o texto de gays que procuravam parceiros em chats dizendo: “não curto gordos” ou “velhos fora”. Com a ascensão da cultura urso no meio gay, estas prerrogativas foram sendo cada vez menos colocadas e manifestadas (a pessoa pode até não desejar gordos, mas é cada vez mais raro ela escrever isto). Aliás, hoje, tem uma quantidade grande que deseja pessoas mais velhas: “curto coroa” é um termo muito presente nos aplicativos de encontros gays. Mais uma prova que gosto se aprimora, se modifica.

Não é uma questão que, mais pra frente, os gays só irão curtir homens mais femininos, mas talvez muito deles irão se permitir, se refletirmos por que nós, homossexuais masculinos, negamos tanto a feminilidade em nós e nos outros como algo desejável.

De fundo e para se pensar,  o não gostar de efeminados passa muito perto pelo mesmo discurso daqueles homofóbicos que dizem que não gostam de gays. A desculpa é a mesma: “é uma questão de gosto”. Será?

David de Michelangelo (Wikicommons)
David de Michelangelo (Wikicommons)

Blogs da Folha

Mais acessadas

Nada encontrado

Categorias

Publicidade
Publicidade
Publicidade