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Os garotos e garotas de Blur

Por Vitor Angelo

“Você é Blur ou Oasis?” Esta pergunta (típica dos anos 1990 e uma espécie de nova e outra versão da rivalidade entre Emilinha Borba e Marlene) tinha contornos mais que musicais. Sabe-se hoje que era uma grande jogada de marketing (Damon e Noel fizeram as “pazes” uma década depois), mas na época a briga entre as duas maiores bandas do Britpop também dizia muito sobre a questão comportamental.  Preferir a banda do vocalista Damon Albarn, do guitarrista Graham Coxon, do baixista Alex James e do baterista Dave Rowntree era estar mais tolerante com as diversas influências musicais que um grupo poderia ter em sua sonoridade, mais crítico na visão de uma vida pós-Margaret Thatcher e todo o seu neoliberalismo e mais fluido no campo das orientações sexuais. Era estar em oposição à influência apenas de uma banda (no caso da sonoridade dos irmãos Gallagher, os Beatles) e ao rock “macho”.

Foram exatamente as afirmações de Damon Albarn, para a imprensa britânica, no auge da fama, que já tinha transado com homens (provocação ou verdade, pouco importa) que faziam Noel e Liam Gallagher dirigir ofensas sobre a sexualidade do vocalista do Blur, proferindo frase de efeitos como a que adorariam que ele “pegasse Aids”. Apesar de tudo ou por isto tudo, um dos grandes hits da banda é “Girls and Boys”, exatamente sobre a complexidade das relações e orientações sexuais do “amor nos 90” e nos anos que se seguem.

E foi com este clássico lançado há quase duas décadas que a banda inglesa abriu sua apresentação no Festival Planeta Terra, no sábado, 9, no Campo de Marte, em São Paulo. “Girls who want boys / who like boys to be girls / who do boys like they’re girls/ who do girls, like they’re boys /Always should be someone you really love (Garotas que querem garotos / que gostam de garotos para ser garotas / que pegam garotos como se fossem garotas / que pegam garotas como se fossem garotos / Sempre tem que ser alguém que você realmente ama)” foi cantado em uníssono pela plateia.

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Certo que o público presente neste festival era menos testosterona, aquele que não precisa se provar macho e hétero. Casais gays conviviam com casais héteros em total harmonia ou indiferença e não foi apenas no show de Lana Del Rey, que fazia parte do line up e era o mais clichê que isso acontecesse. O rock de Beck assim como o rap do The Roots conviveram com esta plateia, que pode deixar tudo menos embaçado, quando Blur começou seu show.  Afinal o que importa é “sempre ter alguém que você realmente ama”. Todos ali tinham entendido o recado.

Voltando ao Blur, a figura de Damon Albarn tem sua importância para o rompimento das fronteiras (invisíveis e limitantes)  entre o que é de hétero e o que é de gay. Em certo sentido, ele embaçou estas demarcações, ainda mais em relação aos roqueiros. Suas afirmações sobre sua (bi)sexualidade, mesmo quando namorava firme com Justine Frischmann, do Elastica, fizeram muitos garotos e garotas, que gostavam de pessoas do mesmo sexo e ao mesmo tempo de rock, se sentirem mais confortáveis. Ele também tinha uma imagem de garoto, masculina, o que era diferente dos roqueiros que questionavam os papeis sexuais e de gênero através da androginia. Seu uniforme não era o glitter e sim o jeans e a camiseta.

“Eles são os  únicos que usam camiseta e jeans e parecem que estão de smoking”, dizia uma amiga entre um drink e outro na Torre, uma casa noturna underground de São Paulo, mas que era assim que também costumava-se chamar as noites de quinta-feira neste mesmo clube, como uma metonímia. A festa Début era comandada pelo DJ Alexandre Bispo e pelo artista plástico Adriano Costa, este, na época, uma metáfora de Damon Albarn. E, não por acaso, foi lá, no final da década de 90, que uma das trilhas tocadas era Blur.

Mais de vinte anos depois, eles ainda usam jeans e camiseta cantando que “o amor é a melhor coisa”, independente se é com outro ou com outra. E nós, que esperamos por este sentimento, pudemos, numa noite quente de sábado, saber que o amor veio. Oh why, Oh my!

Damon Albarn no palco. Blur encerra a sétima edição do festival Planeta Terra (Avener Prado/Folhapress)

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