Nas últimas semanas, o centro das discussões da eleição municipal de São Paulo foi algo que está fora do debate entre os que querem saber qual o projeto de cidade que os dois candidatos restantes têm para a maior metrópole do país. Um kit educacional contra a homofobia está no alvo tanto de Serra como de Haddad. Em um primeiro momento, para um deles foi como ataque e para o outro foi como esquecimento. Depois, como um espelhamento, se inverteu.
Serra já no primeiro turno das eleições municipais voltou a usar a mesma tática de tentar atrair para si um eleitorado conservador. Quando na corrida presidencial de 2010, ele questionou Dilma Rousseff sobre sua posição favorável ao aborto – a “forçando a recuar”. Desta vez, foi com o tal do “kit gay”, nome pejorativo dado pela bancada fundamentalista do Congresso sobre material didático contra a homofobia que seria distribuído em escolas públicas. O projeto foi feito e elaborado com Fernando Haddad como ministro da Educação. Ataque.
Dilma vetou o kit “Escola sem Homofobia” por pressão da bancada evangélica. Para não acontecer uma manobra mais forte destes políticos para averiguarem as suspeitas de aumento de patrimônio do então ministro Antonio Palocci, a presidente não pensou duas vezes em ceder à pressão dos conservadores de sua base governista. Claro que o discurso de fachada foi outro, o material foi rejeitado porque “não era bem feito” (suspeite de todo político e militante que vira um esteta de uma hora pra outra). O então ministro da Educação sinalizou que o projeto só estava temporariamente suspenso. Já o candidato Haddad na sabatina Folha/UOL no primeiro turno se responsabilizou pelo ato do veto junto com Dilma, algo que ele não tinha feito antes. Esquecimento.
É bem verdade, os dois candidatos preferiram o discurso do atraso, do obscurantismo, retornaram ao armário para usar uma linguagem bem gay.
No segundo turno das eleições municipais, temos a volta do tema agora com uma reviravolta digna de novela. Serra, em 2009, quando governador de São Paulo, aprovou e distribuiu um kit contra a intolerância e a homofobia muito semelhante ao que seus aliados – entre eles o pastor Silas Malafaia – tanto praguejaram contra. Dois vídeos aliás eram idênticos aos kit que petistas vetaram e depois chamaram de “mal-feitos”. A arma política homofóbica do tucano em ataccar o “kit gay” de Haddad acabou sendo apontada para ele mesmo. Esquecimento?
Já a colunista da Folha Vera Magalhães publicou a seguinte nota no dia 12 de outubro: “Lula tem dito que Haddad precisa se posicionar sobre a polêmica do ‘kit gay’ o quanto antes, para evitar desgastes. Quer que o candidato declare que não adotará material similar caso eleito”. Ataque?
Um projeto que era para educar os professores a ensinar os alunos a serem tolerantes com outras crianças e pessoas diferentes delas acabou se transformando – de forma mentirosa – em um kit que transformaria os jovens em gays. Em seguida, usado como moeda de troca para livrar o ministro Palocci de qualquer acusação mais pesada que poderia pairar sobre ele e o PT. Depois, como discurso de ódio de religiosos fundamentalistas e políticos conservadores, usado pelo candidato tucano como arma de ataque (baixíssima, diga-se) em campanha eleitoral. E por fim, como jogatina política de dois partidos que nasceram com a democratização do país e que possuíam projetos modernizadores da sociedade. Lamentável.
Com as negações de todos eles em relação a um projeto pela diversidade e tolerância e seu uso político da forma mais safada, podemos concluir que os homossexuais, bissexuais e transgêneros são hoje o bode expiatório. E, exemplos históricos, sempre mostraram que isto nem sempre acaba bem… para os gays.