Blogaybrasil – Blogay http://blogay.blogfolha.uol.com.br A contribuição dos gays, lésbicas e travestis para o mundo Wed, 18 Nov 2015 02:07:18 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Depois do casamento igualitário no Brasil http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2013/05/15/depois-do-casamento-igualitario-no-brasil/ http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2013/05/15/depois-do-casamento-igualitario-no-brasil/#comments Wed, 15 May 2013 11:00:13 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/11328453.jpeg http://blogay.blogfolha.uol.com.br/?p=1261 Com a decisão do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), nesta terça-feira, 14, de exigir que todos os cartórios do país não neguem mais o direito aos casais do mesmo sexo de se casarem e que suas uniões estáveis se transformem automaticamente em casamento, o Brasil – de forma sui generis – entra no rol dos países civilizados que o direito dado aos LGBTs são os mesmo que aos heterossexuais.

Mapa com os países que o casamento igualitário está aprovado (Arte/Uol)

Digo sui generis porque o Brasil continua sendo o país do jeitinho. Se em quase todos os outros países (com exceções da África do Sul e do Canadá, como apontaram leitores do blog) que legalizaram o casamento igualitário foi o Legislativo com o empenho enorme do Executivo que protagonizaram esta conquista, no nosso país este papel está sendo feito pelo Judiciário.

Além disso, foi um movimento que também teve a participação ativa de (poucos) partidos políticos, entidades da sociedade civil e militantes dos direitos humanos. Em dezembro do ano passado,  o Instituto Brasileiro de Direito da Família (Ibdfam), com sede em Belo Horizonte, pediu o regulamento em âmbito nacional do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. No dia 6 de abril deste ano,  o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e a Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Rio de Janeiro (Aspen) protocolaram no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) o mesmo pedido.

Mas a luta é bem mais antiga como conta o cyber-ativista Benjamin Bee em relato ao Blogay.

“Em 2001, Portugal aprovava as Uniões de Facto [o nome dado ao projeto de uniões estáveis em terras portuguesas]. O Brasil em seguida pegou fogo de desejo de aprovar a Parceria Civil da Marta Suplicy. Nunca o MLGBT brasileiro esteve tão unido, tanto que atraiu a atenção do estrangeiro que também participou de uma campanha fenomenal para que o Congresso aprovasse o projeto de lei. Chegamos a enviar tantos e-mails para as caixas postais dos deputados que o sistema da Câmara chegou a travar. Os deputados reclamaram, Rita Camata pediu que não mandássemos mais e-mails. Mas o que fazer? Eles chegavam, tínhamos que encaminhar. Aí, pra aliviar a barra, o grupo que administrava a campanha resolveu mandar por pacote. Bom, ao final Roberto Jefferson e Aécio Neves ‘decidiram’ que o projeto não iria à votação. Aquela desculpa de sempre que existe até hoje. Vocês sabem como o Congresso é com nossos assuntos, em particular com o casamento [igualitário].

Dez anos depois, o STF (Supremo Tribunal Federal) nos brinda com a união estável e, mais dois anos, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), com o casamento. Uma luta que na verdade começou há mais de 12 anos.

Fui à rua, fui comprar pão e não me saía da cabeça que agora vivo num país onde dois homens e duas mulheres podem se casar. Como se um ciclo tivesse se fechado. Mesmo assim, a ficha ainda não caiu.

Há uns três anos, entrei no Orkut e me inscrevi num grupo que apoiava o casamento gay, o ‘Eu apoio casamento gay’. Ali conheci vários que hoje estão aqui e entre eles justamente o Walter Silva. Foram meses lindos, até que o STF resolveu que ia julgar a ADIN e a ADPF. Ninguém acreditava que seria possível. Eu não só acreditei como fui o único que acreditou em decisão unânime dos Ministros. Claro que me acharam maluco. Teve gente que falou que algum deles pediria vistas do processo e eu disse que seria aprovado sem pedido de vistas. E não deu outra. Saiu rapidinho.

E eu dizia que sendo admitida a união estável, a conversão em casamento deveria ser automática. Waltinho não botava fé. E eu ainda dizia que depois da conversão automática, também deveria ser automático o casamento direto. Quer dizer a igualdade plena.

O STF foi além da união estável e declarou a família homoparental legítima. Agora é só uma questão pró forma.. O Código Civil vai ser modificado e a situação regularizada na lei. Não há como fugir disso. É questão praticamente encerrada faltando agora só a burocracia parlamentar.

Isso não vai dar fim à homofobia, nem vai aliviar. Porque são tão poucos os casais homoafetivos que eles desaparecerão na sociedade. O fim da homofobia, que é sim a liberdade a ser alcançada, só virá com a equiparação da homofobia ao racismo. Equiparação, não basta criminalizar. É fundamental que as pessoas LGBTs recebam o mesmo respeito que os afrodescendentes, os étnicos, judeus…

Chegou a hora do partido do governo, e do Executivo fazerem a sua parte. Dilma prometeu não interferir no casamento mas prometeu acabar com a homofobia. Agora é com o Senador Paulo Paim”.

Em um certo momento, nos últimos dois anos, a militância dividiu prioridades, alguns lutavam com mais empenho pelo casamento igualitário e outros pela criminalização da homofobia. Com o processo de um quase se encerrando, o foco agora é tentar equiparar os crimes homofóbicos aos de racismo e contra mulher. O PLC 122 – projeto de lei que crimanliza a homofobia –  está nas mãos do senador Paulo Paim (PT-RS), por isto apelo de Bee. Ainda há muita história para ser feita.

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Manifestação contra Marco Feliciano (um relato pessoal) http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2013/03/09/manifestacao-contra-marco-feliciano-um-relato-pessoal/ http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2013/03/09/manifestacao-contra-marco-feliciano-um-relato-pessoal/#comments Sun, 10 Mar 2013 02:00:30 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/11328453.jpeg http://blogay.blogfolha.uol.com.br/?p=1129 Nesta tarde de sábado, 9, nesta terra de Macunaíma, a preguiça deu espaço para a reação, para a tomada de posição, para a indignação e principalmente para a cidadania. Insatisfeitos com a nomeação do deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP) – acusado por ativistas de racismo e homofobia e investigado pelo STF por estelionato – para a presidência da Comissão dos Direitos Humanos e Minorias,  os brasileiros resolveram sair às ruas.

Manifestação contra o deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP) em São Paulo (Clara Averbuck)

Eu resolvi sair também. A primeira estranheza era a quase ausência de bandeiras de partidos políticos. É muito cedo para dizer se isto é positivo ou não, mas é novo! Muitos movimentos e manifestações que se dizem apartidários ou supra partidários e nascem nas redes sociais – como este – deixam claro no primeiro grito de guerra na rua as suas filiações partidárias. Ali afirmava-se acima dos partidos que eram os movimentos sociais e pessoas independentes que queriam mostrar sua indignação.

Uma surpresa boa: encontrei amigos que raramente os vejo neste tipo de evento. Eles estavam lá, firmes, gritando,  algo neles sinalizava que as negociações políticas tinham ido longe demais, eles não podiam mais ser indiferentes.

Da mesma forma, foi super orgânica a união, em determinado ponto da passeata, entre os que protestavam contra Feliciano com os que pediam a renúncia de Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência do Senado. Quem acompanhou pela internet, presenciou brigas homéricas entre os participantes de um e o de outro evento, mas quando tudo saiu da virtualidade e se tornou real, percebeu-se como de fundo as duas causas se assemelhavam.

Manifestação contra Marco Feliciano (PSC-SP) desce a rua da Consolação, em São Paulo (Shin Shikuma/UOL)

Assim como nunca ficou tão límpido que a luta pelos direitos gays (as faixas pedindo a aprovação do PLC 122 se fizeram bem presentes) é de fundo igual a dos negros, mulheres, cadeirantes. Uma cadeirante me emocionou muito ao fazer questão de fazer o percurso da passeata todo (da Paulista até a Roosevelt e voltando para a Paulista) em calçadas e ruas em péssimo estado. Ela estava dizendo a  todos  que assim estava se irmanando com as causas como todos ali.

No caldeirão das diferenças: uns contra o Renan, outros contra Feliciano, outros denunciando racismo, outros homofobia, misoginias, percebemos ali  de forma muito clara que estávamos todos falando das mesmas coisas: isonomia e cidadania.

Manifestantes se beijam explicitando que tanto a causa LGBT como a negra são de mesmo fundo (Adriano Vizoni/Folhapress)
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O comediante, a cartunista e os assassinatos http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2013/01/11/o-comediante-a-cartunista-e-os-assassinatos/ http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2013/01/11/o-comediante-a-cartunista-e-os-assassinatos/#comments Sat, 12 Jan 2013 00:00:25 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/11328453.jpeg http://blogay.blogfolha.uol.com.br/?p=1007 O ano não começou nada bem para os gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros. Houve um aumento de quase 27% de crimes de ódio contra os LGBTs no ano de 2012 em comparação com o ano anterior.  Foram 338 assassinatos segundo relatório do Grupo Gay da Bahia (GGB) que se baseia em informações retiradas de notícias da imprensa.

A notícia causou celeuma entre os intolerantes de toda ordem. Como só 338, heterossexuais morrem muito mais, ruminaram pelas redes sociais. Para além da burrice de que não importa se morrem um ou mil, o assassinato é um ato abjeto seja com quem for, tem um grande detalhe: não se morre por ser ou aparentar ser hétero.

Laerte sempre brilhante desenhou a situação com precisão

Tira de Laerte Coutinho

Mas contra a intolerância não há racionalidade ou argumentos que consigam derrubar a sua (i)lógica.

E o ódio continuou a argumentar de má fé, até que o comediante Danilo Gentili resolveu se colocar como arauto do suposto politicamente incorreto e em seu Twitter escreveu 140 caracteres de algo que ele gostaria de acreditar ser engraçado.

(Reprodução/Twitter)

O deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) acabou “batendo boca” com ele e no final divulgou um texto sobre todo o episódio que vale leitura.

Gentili é de uma turma recente de comediantes que se pretende libertária ao afrontar o politicamente correto. A ideologia, que surge com a esquerda norte-americana e os chamados “New Studies”, colocou em um primeiro momento, através de novos termos como, por exemplo, afrodescendente, tirar certas conotações preconceituosas contra as minorias, isto é, fazer correções pelas opressões que grupos minoritários sofreram.

Numa certa inversão de valores feita pela má fé dos intolerantes e também por um excesso de zelo (e autoritarismo?) dos grupos que colocaram os termos politicamente corretos na mídia e na língua do mundo, eles logo ganharam uma certa antipatia pública. Ficou legalzinho ser politicamente incorreto. Estava ali, naquelas palavras que pretendiam não ofender outras pessoas, uma afronta à “liberdade de expressão”, seja lá o que isto quer dizer.

Criou-se então uma falsa dicotomia, de um lado a liberdade de expressão e de outro o politicamente correto. Mas o que é curioso é que esta tal “liberdade de expressão” é apenas e simplesmente o direito de detonar as minorias. Os poderosos, as grandes corporações (muitas vezes patrocinadores destes comediantes), o status quo vigente nunca é questionado, e se raramente o é, é bem superficialmente como perfumaria. Isto é, a anarquia e a liberdade não passam de algo fake, marketing.

Um exemplo claro disto é Rafinha Bastos, da mesma trupe de Gentili. Tudo ia bem ao reverenciar estupro de mulher feia, mas no momento que o desavisado mexeu com a cantora Wanessa, casada e ligada a pessoas poderosas, recebeu o recado explícito até onde ia sua tal “liberdade”, sendo demitido de um programa e hoje meio fadado ao ostracismo. Gentili sabe bem – até através do exemplo de Bastos – da fina linha estreita da tal liberdade e da suposta posição libertária que tenta vender aos seus súditos.

No fundo, seu humor libertário é o mais aprisionado de todos e ligado ao pior do conservadorismo do país.

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Enquanto Gentili ri dos mortos, eu choro pelos vivos:

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Artista expõe obra sobre a homofobia no Brasil, em Nova York http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2012/07/17/artista-expoe-obra-sobre-a-homofobia-no-brasil-em-nova-york/ http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2012/07/17/artista-expoe-obra-sobre-a-homofobia-no-brasil-em-nova-york/#comments Tue, 17 Jul 2012 18:30:18 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/11328453.jpeg http://blogay.blogfolha.uol.com.br/?p=607 A barbárie brasileira em relação aos homossexuais chega às terras norte-americanas em forma de arte. Cyríaco Lopes, artista plástico brasileiro, radicado nos Estados Unidos e professor de arte na City University of New York (John Jay College), expõe a partir de 7 de agosto, na President’s Gallery, em Nova York, sua série Crimes Against Love (Crimes contra o Amor).

São mortalhas (o lençol que envolve os mortos) com fotos de esculturas antigas impressas em tecidos e um texto que conta de forma sucinta algum assassinato violento contra homossexuais no país. O artista percebe que existe uma verdadeira guerra contra os gays no Brasil.

Obra de Cyriaco Lopes (Divulgação)

“___, 2012.  Enterrado vivo pelo padrasto.  Tinha 14 anos e tentava ser abertamente gay”, diz a legenda que acompanha a mortalha.  O grito parece ancestral, mas como uma dor que ainda ecoa nos dias de hoje.

Ao fotografar esculturas antigas, desgastadas, o artista evoca o tempo como senhor do passado e do presente, como algo que está no passado e continua no presente, no caso a violência (desse tempo) e de forma mais explícita, a homofobia.

Obra de Cyriaco Lopes (Divulgação)

O historiador da arte E. H. Gombrich, no seu clássico livro “A História da Arte” em sua leitura sobre as estátuas gregas do período clássico escreve: “[…] Erguem-se diante de nós como seres humanos de verdade, mas ao mesmo tempo, como seres de um mundo diferente e melhor. São, de fato, seres de um mundo diferente, não porque os gregos fossem mais sadios ou mais belos que os outros homens – não há qualquer razão para pensar  que fossem -, mas porque a arte, nesse momento, atingiria um ponto  em que o típico e o individual eram colocados num novo e delicado equilíbrio.”

Podemos estender esta visão do estatuário grego para outras artes das antigas civilizações, principalmente as que sofreram influência da cultura grega, o chamado período helenístico como uma das chaves para entender que Lopes está propondo um mundo diferente e melhor, aquelas peças destruídas pelos tempos foram seres diferentes e em certo sentido, em sua diversidade típica e individual, seres melhores.

Obra de Cyriaco Lopes (Divulgação)

Outro ponto importante a enxergar é que ao escolher imagens de estátuas da Idade Antiga, temos na verdade que recorrer ao espaço off, aquilo que não pode ser visto. Os estudiosos da arte antiga tem que completar com a imaginação os braços de uma Vênus de Milo ou um torso etrusco.  E com a mesma imaginação que temos que deslumbrar as vidas perdidas no Brasil por causa da homofobia. A extensão dos corpos que não puderam viver em sua plenitude, mas apesar da agressão dos tempos, eles ainda ora sussurram ora gritam o quanto nosso país está longe daquilo que pode ser chamado de civilização.

A arte contra o ódio!

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Mademoiselle é a primeira rapper travesti do Brasil http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2012/05/03/mademoiselle-e-a-primeira-rapper-travesti-do-brasil/ http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2012/05/03/mademoiselle-e-a-primeira-rapper-travesti-do-brasil/#comments Thu, 03 May 2012 22:00:14 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/11328453.jpeg http://blogay.blogfolha.uol.com.br/?p=297
A rapper Mademoiselle (Divulgação)

Quando o rap nasceu, nas profundidades do Bronx, já surgia ali dois elementos que parecem estar em sua essência: a diversidade e a contestação. Estavam ali, no “Planet Rock”, o globo terrestre musical que poderia unir os alemães do Kraftwerk com jamaicanos como Kool Herc e seus sound systems. Do que era diverso, saiu toda uma poética de protesto e uma ação afirmativa ao retratar a vida de uma minoria que, mesmo depois de mais de um século de abolição, ainda vivia em condições quase escravas.

O rap une periferias do mundo e é a música que rima com excluídos. Então não seria estranho outras minorias excluídas sentirem-se atraídas por esta forma de poesia e ritmo. É por esta e outras razões que Mademoiselle Lulu Mon’Amour, de Goiânia, é a primeira rapper travesti do Brasil.

Claro que, assim como o rap é uma espécie de documentário musical de uma certa realidade, a vivência de Mademoiselle como travesti não poderia estar de fora de suas composições. Temas como a homofobia e o preconceito fazem parte de sua “diss” (canção de insatisfação).

“O movimento [hip hop] ainda carrega o machismo e os rappers ainda são sim muito machistas. Acho lastimável!” diz ela em sua página do Soundcloud. “Se para as mulheres em cena no movimento já era difícil serem ouvidas pra mim é apenas uma etapa a ser vencida! Meu som é pra todas as manas, mulheres guerreiras e batalhadoras, gays, lésbicas ou qualquer pessoa que já sentiu desconforto, desprezo ou humilhação com qualquer preconceito seja de teor racial ou sexual imposto pela sociedade.”

Solta a poesia, Mademoiselle!

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Vargas Llosa, a direita, a esquerda e os gays http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2012/04/26/vargas-llosa-a-direita-a-esquerda-e-os-gays/ http://blogay.blogfolha.uol.com.br/2012/04/26/vargas-llosa-a-direita-a-esquerda-e-os-gays/#comments Fri, 27 Apr 2012 02:55:52 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/11328453.jpeg http://blogay.blogfolha.uol.com.br/?p=280
O escritor peruano Mario Vargas Llosa (Eduardo Knapp - 13.out.2010 / Folhapress)

Mario Vargas Llosa escreveu recentemente no jornal El Pais, um texto chamado “La Caza del Gay” (“A Caça/Perseguição aos Gays”). Ainda no calor do choque da morte do jovem homossexual chileno Daniel Zamudio atacado por neonazistas, o escritor peruano tentou jogar luz sobre a homofobia latino-americana.

“Esperemos que a imolação de Daniel Zamudio sirva para trazer à luz a trágica condição dos homossexuais, lésbicas e transexuais nos países latino-americanos onde, sem uma única exceção, são objeto de escárnio, repressão, marginalizados, perseguidos e alvo de campanhas de descrédito que, no geral, contam com o apoio declarado e entusiasmado da maioria da opinião pública”, diz um trecho do texto que você pode ler na íntegra traduzido para o português clicando aqui.

Um ponto importantíssimo focado no texto de Llosa: “No que se refere à homofobia, a esquerda e a direita confundem-se como uma única entidade devastada pelo preconceito e a estupidez. Não só a Igreja Católica e as seitas evangélicas repudiam o homossexual e opõem-se obstinadamente ao matrimônio de gays. Os dois movimentos subversivos que nos anos 80 iniciaram a rebelião armada para instalar o comunismo no Peru, o Sendero Luminoso e o MRTA – Movimento Revolucionário Tupac Amaru – executavam os homossexuais de maneira sistemática nos povoados que controlavam para libertar a sociedade de semelhante praga”.

Vargas Llosa é um homem de direita, já concorreu à presidência do Peru em 1990, e considera-se um neoliberal na área econômica – quase um sacrilégio para quem se diz de esquerda.  Mas, assim como os gays, ele já foi alvo de intolerância ao ganhar o Prêmio Nobel de Literatura em 2010. Intelectuais de esquerda da Suécia tentaram, em vão, fazer uma campanha para que não lhe dessem o prêmio porque o escritor era… de direita.

O conceito esquerda e direita, dizem, hoje é ultrapassado. Os termos surgidos durante a Revolução Francesa servem para indicar de um lado os progressistas, os que querem mudanças ( a esquerda) e de outro os conservadores e os que querem preservar as tradições (a direita).

Na Era Moderna, o embate ganha força pois está na essência da modernidade, a questão do novo e sua obsolescência para um outro novo. Parece que desta forma a esquerda ganharia vantagens, mas o que realmente aconteceu foi uma espécie de maniqueísmo que apontava – dependendo de sua posição ideológica –  para campos esquemáticos como tal linha é “do bem” e a outra “do mal”.

O movimento para a liberação das minorias, mas mais ainda o movimento gay, colocou em xeque este esquematismo. Se a princípio a militância homossexual se alinhou à esquerda (a que anseia mudanças),  com o tempo foi percebendo  que ela – em sua totalidade – não atendia todas as suas demandas. João Silvério Trevisan no livro “Devassos no Paraíso” conta com muito pesar como  a cooptação do movimento gay  brasileiro pelos partidos de esquerda nos anos 80 acabou prejudicando o próprio movimento nascente.

Em uma passagem do livro, ele conta que procurou um militante para pensarem uma campanha contra a Aids e recebeu a resposta que a doença era imperialista e só afetaria as bichas burguesas, os proletários estariam a salvo. Ledo engano, pois esse militante iria contrair o vírus algum tempo depois, segundo relato de Trevisan.

Alinhar-se à esquerda ou à direita não significa muito em relação aos direitos civis homossexuais que precisam ser conquistados. Talvez uma grande conquista dos militantes gays é cada vez mais ter a chamada independência crítica. Foi o que aconteceu recentemente quando a ala LGBT do PT que criticou duramente o senador Lindbergh Farias do mesmo partido, por defender Silas Malafaia – um dos principais opositores aos direitos gays no país. Ou mesmo assistirmos uma presidente – Dilma Rousseff – que se considera de esquerda vetar sistematicamente políticas em relação aos gays, lésbicas e trângeneros, enquanto que no Chile, onde Daniel Zamudio foi brutalmente assassinado, um presidente de direita – Sebastián Piñera – se esforça pessoalmente para que a lei anti-homofobia seja aprovada o mais rápido possível em seu país, apesar de ainda estar em trâmite no Congresso chileno.

De certa forma, as questões homossexuais ajudaram e ajudam a quebrar o esquematismo e o maniqueísmo que cerca uma maneira simplista de enxergar a política e a ideologia.

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